O Siprovel (Sindicato dos Professores e Professores da Educação Infantil da Rede Pública Municipal de Ensino de Cascavel) protocolou na Câmara Municipal de Cascavel, aos cuidados do presidente da casa, vereador Alécio Espínola, um parecer jurídico a respeito do Projeto de Lei 113/2019, de autoria do vereador Olavo Santos, que dispõe sobre a Educação Domiciliar (homeschooling) em Cascavel. O PL começou a tramitar na casa no dia 20 de setembro, já tendo passado pela Comissão de Redação e Justiça, onde recebeu parecer contrário por unanimidade dos membros da comissão. De acordo com entrevistas concedidas por Olavo à imprensa, o projeto deve ser lido na sessão do dia 29 de outubro.
O parecer, elaborado pela assessoria jurídica do sindicato, aponta que, com base na Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre normal gerais do sistema de educação (diretrizes e bases da educação nacional) “e, por isso, não há legitimidade por parte do Poder Executivo Municipal ou de integrantes da Câmara de Vereadores para legislar sobre esta matéria, ou seja, sobre Educação Domiciliar (Homeschooling) sem que haja Lei Federal que a regulamente”, destaca o parecer. A assessoria jurídica ainda destaca que existe incompatibilidade entre a educação domiciliar e os dispositivos constitucionais, dentre eles, os que dispõem sobre o dever dos pais de matricular os filhos e da frequência à escola.
A evidência destes elementos, está no fato de que em maio deste ano, o plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu pela maioria dos ministros da corte pela inconstitucionalidade do ensino domiciliar, em razão de sua incompatibilidade com dispositivos constitucionais. “Já no que diz respeito à formação da cidadania, o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou a importância da educação como forma de construção da cidadania e da vida pública, por meio do engajamento dos indivíduos, numa perspectiva de cidadania ativa”, destaca o texto.
Além de Alécio Espínola, receberão o parecer jurídico: o proponente do projeto, Olavo Santos; o prefeito Leonaldo Paranhos; a secretária de Educação, Márcia Baldini; Marília Montiel Coutinho, presidente do Conselho Municipal de Educação; e o promotor de justiça Luciano Machado, da 8º Promotoria Pública da Comarca de Cascavel.
Audiência Pública Nacional
No último dia 15, uma audiência pública nacional, realizada no Senado, debateu o tema. Da mesa, participou a secretária de Educação de Cascavel, Marcia Baldini, que também é vice-presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação. Marcia defendeu a escola como a responsável pela mediação do conhecimento científico e da socialização. Segundo ela, a criança ali aprende a conviver em grupo e essa interação é base para o desenvolvimento social.
A secretária municipal de Educação trouxe questionamentos sobre a educação domiciliar, como a falta de evidências científicas sobre a qualidade desse ensino, e enfatizou que há pautas mais importantes, como a evasão escolar, a melhoria das escolas, e o financiamento da educação. Ela também questionou a formação acadêmica a ser exigida dos pais que pretendem fazer homeschooling e como será feita a fiscalização.
“É um assunto ainda bastante incipiente, que causa bastante polêmica, porque ainda não temos pesquisas suficientes sobre isso, tanto no nosso país, quanto em outros países. Hoje temos cerca de 48 milhões de matrículas no ensino regular e temos algumas pesquisas mostrando que pode haver em torno de 16 mil crianças no ensino domiciliar. Então é um número bastante pequeno”, disse.
Retrocesso
Para a presidente do Siprovel, Josiane Maria Vendrame, a proposta do ensino domiciliar, além de ferir a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no que diz respeito ao direito à educação, é dever do estado assegurar à criança e ao adolescente o ensino fundamental obrigatório e gratuito.
“As práticas de desescolarização não são compatíveis com o imperativo constitucional de formação integral e de socialização do educando. A função socializadora da escola, o princípio de pluralismo de ideias e da transmissão de conhecimentos científicos, artísticos e filosóficos, são necessários para a construção da cidadania. Além disso, o encarceramento do educando impede a compreensão e respeito às diferenças, tão importantes na formação de uma sociedade”, destacou a presidenta do sindicato.
EAEDs
O sindicato estranha o fato de as EAEDs (Entidades de Apoio à Ensino Domiciliar) serem recorrentemente citadas ao longo do projeto, com exatas oito citações, em diferentes parágrafos, ao longo do texto de quatro páginas. A proposta coloca estas entidades (que podem ser com ou sem fins lucrativos) como são responsáveis pela manutenção dos dados avaliativos e pelo cadastro – e manutenção deste – das famílias optantes pela educação domiciliar. O texto ainda detalha que as EAED cadastradas na Secretaria Municipal de Educação (SMED) servirão como instituição privada de apoio aos pais de educandos em ensino domiciliar. Ou seja, o projeto claramente favorece determinado setor do mercado, repetidamente citado ao longo do texto.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil